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sexta-feira, 23 de março de 2018

CULTURA POPULAR - COMO É A PROCISSÃO DO FOGARÉU NA CIDADE DE GOIÁS

É meia-noite na Cidade de Goiás.  Não se ouve mais o triste canto da juriti, “a terra vazia emudece”. Como num ato de vassalagem ao sempre fiel e obstinado relógio da torre do Rosário, vagarosamente desmaiam-se os bucólicos candeeiros que realçam a “despretensiosidade” e singeleza das pedras, as quais agasalham as ruas e os suspeitos becos de meu torrão querido.
Rufos de tambores rompem o silêncio prevalente na pacata vila, logo depois lampejam tochas na porta da Boa Morte, de onde surgem quarenta homens descalços encapuzados e vestidos em indumentárias de diversas cores, são eles os chamados farricocos, considerados por alguns vilaboenses uma perversa representação dos soldados romanos que perseguiram Cristo.
Ao som da fanfarra dá-se início à Procissão do Fogaréu, que começa em frente ao Museu de Arte Sacra, na Praça do Jardim, e desce em direção à escadaria da Igreja do Rosário, onde os farricocos encontram a mesa da última ceia já dispersa.
Durante a Procissão, uma atmosfera de angústia e esperança envolve a multidão que assiste emocionada ao espetáculo, angústia por já saberem o que acontecerá com Jesus Cristo, sofrem juntos com Ele até a crucificação na Sexta-Feira da Paixão, porém também sentem esperança, pois sabem que no Domingo de Páscoa Ele ressuscitará, e sentem a mesma esperança quanto ao Seu indeterminado retorno. São muitos também os que sentem medo durante a realização do evento, quando assisti pela primeira vez, lembro-me de não ter tido medo da escuridão, mas sim receio das tochas e mais ainda dos farricocos, figuras que apavoram sem o menor esforço uma criança.
Uma das partes mais emocionantes é quando os farricocos sobem as escadarias da Igreja São Francisco de Paula que representa o Monte das Oliveiras, e o som do clarim rompe a escuridão da noite, reverbera e é sentidamente murmurado pelo rubro rio. Um farricoco de branco empunha um estandarte com a imagem de Cristo pintada pela Professora Maria Veiga Jardim, que achou melhor substituir a de Veiga Valle pela sua para a original não sofrer grandes danos.
Depois da fala do Bispo de Goiás e terminada a prisão de Cristo, a Procissão retorna à Praça do Jardim, seu ponto inicial. Sob aplausos a Procissão do Fogaréu é encerrada. Acendem-se os lampiões e a Cidade de Goiás acorda das trevas. A Procissão do Fogaréu tem suas origens nos países ibéricos, de onde fora trazida em 1745 pelo padre espanhol João Perestrello de Vasconcelos Spínola, segundo relatos de pessoas mais antigas, somente os homens podiam participar.
Durante décadas a Procissão do Fogaréu ficou sem ser realizada na Cidade de Goiás, muito já havia se perdido no tempo. Até que em 1965 foi fundada a Organização Vilaboense de Artes e Tradições (OVAT), e em 1966 com o apoio da OVAT, a Procissão do Fogaréu voltou a ser realizada na Cidade de Goiás com incentivo e apoio de diversas pessoas, entre elas destaco Elder Camargo de Passos, Antônio Carlos Bastos Costa Campos, Hecival Alves de Castro, Antolinda Baía Borges, Goiandira Aires do Couto, Humberto do Nascimento Andrade, as irmãs Joíza e Joíce Pereira de Oliveira e diversas outras pessoas de bem que direta ou indiretamente ajudaram a resgatar a tradição da realização da Procissão do Fogaréu.
Anualmente mais de 10 mil turistas vão à Cidade de Goiás para assistir à Procissão do Fogaréu e demais eventos da Semana Santa, como por exemplo: o Canto do Perdão dos Homens na Igreja D'Abadia, o Canto do Perdão das Mulheres na Igreja São Francisco de Paula, as outras procissões, o canto da Verônica executado pela cantora lírica Anna Rita Ludovico Ferreira da Silva, a encenação da Paixão de Cristo e também o Descerramento da Cruz.(com Portal Raizes)

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