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sexta-feira, 22 de março de 2019

REMINISCÊNCIAS…! SAUDADE…!

A vida proporciona uma dinâmica intermitente que acaba sendo a responsável pela transmudação dos costumes. E, embora a evolução impulsione sempre para a frente, o que se observa na história dos povos é que ocorre, em verdade, uma renovação nos ciclos, ainda que o aperfeiçoamento do progresso destine sempre nova roupagem aos mesmos hábitos.
Com tantas festas que – pelo menos aqui na Bahia – conflagram em fins e início dos anos a agitação das pessoas, acaba desaguando as ideias sobre os hábitos que se renovam. E, de alguma sorte, a consequência conduz à nostálgica saudade, resultante da longa estrada percorrida que nos distancia de tantas opções que povoaram a nossa caminhada.
Ocorre-me, por acaso, o quanto a mutação natural transformou, por exemplo, os modelos de dança que motivam e rejubilam os dois sexos. Remonto aos anos quarenta e cinquenta em que o samba de raízes padecia aos avanços dos boleros, rumbas, mambos, cha-cha-chás, e quejandas, que nos enviavam da centro-América.
Àquela quadra, inspirava os casais a dança em par, rostos colados, corpos coligados, respiros externando o prazer do encontro. E a languidez, nunca rara, dos passos ritmados ocorria nas tão festejadas “boites” da época, que se constituíam no desaguadouro das muitas expectativas.
Recordo-me de que a preferência dos jovens aqui em Salvador gravitava em torno das casas tão em voga à época, como o “Cloc-Bar” e o “X-Ka Bar”, a “boite” do Hotel da Bahia, a da Pituba, a do Edifício Oceania, o “Anjo Azul”, este como desguadouro dos intelectuais. 
Rivalizavam com estabelecimentos mais populares e um tanto reservados, como o “Bolero” de Sandoval Caldas, os tradicionais “Rumba Dancing” e Tabaris, a academia de danças de Molulo, no Peloruinho, o “Yara”, entre tantos. Todos gravitando nos limites do Centro Histórico.
A dança, então, tinha, em verdade, um sentido sensual que inspirava os casais na articulação de passos sempre bem conjugados, mas conduzidos pela obediência ao ritmo presidido pela cadência dolente que, nunca raro, estava envolvida pelos romances inspiradores.
No entanto, como todos os hábitos, aqueles também tiveram o seu ciclo interrompido por uma nova leva de criatividade. Enviada pelos novos movimentos musicais egressos do Reino Unido e dos Estados Unidos, resultou em que a certa tranquilidade  dos bailes de então passou a ganhar roupagem nova. Das amenidades em torno do que giravam as danças de então, desaguou-se na agitação que o “swing” se viu transmudado em “Rock-in-Rolls” e “Twists” cartelizados pelos “Elvies Presleys”, “Beatles”, Michael Jackson e “Rolling Stones”, multiplicados em tantos outros intérpretes, que conduziram a agitação da performance individual para as pistas de dança.
E o sentido da dança conquistou nova destinação. Não mais a coalizão dos pares, mas a individualidade passou a presidir as performances. Jovens de ambos os sexos desgarraram-se para exibir as suas habilidades através dos febris movimentos que passaram a habitar os salões de baile e as casas de espetáculos.
Se, por um lado, a dança perdeu o certo clima de romance, por outro, ganhou na extrema dinâmica que lhe consumiu toda para fazer derramar sobre as pistas a agitação exultante de autênticas multidões. Com a transmudação da dança no tempo, os hábitos consequentes da mesma sorte transformaram o panorama social. Os clubes que também constituíam a destinação dos jovens dos anos quarenta e cincoenta, perderam espaço e já não mais entregam os seus vastos salões para as tertúlias mensais que tanto movimentaram a mocidade.
As exteriorizações rítmicas de hoje não dependem de espaço adredemente reservado. Em qualquer local, bastando que um som qualquer conduza à provocação, grupos e até multidões se aglomeram entorno para, numa dinâmica de movimentos, dar vazão à sua ansiedade. Pode ser mesmo em via pública. E é necessário apenas um veículo portador de uma aparelhagem de som apropriada para fazer reunir tantos grupos a quantos alcancem os seus “decibéis”.
Essa prática tanto se popularizou e conquistou espaços diversos que acabou desaguando em legislação proibitiva em respeito ao uso dos postos de abastecimento, locais que chegaram a constituir a preferência de muitos. Verdade que essa prática, por envolver, nunca raro, multidões, sempre mobilizadas pelo estímulo alcoólico, pode resultar em comportamentos violentos e agressivos.
E, de certo modo, entendo que um dispositivo deve ter contribuído de forma expressiva para que, no Brasil, essa transformação de hábitos se intensificasse. Os “trios elétricos”, sem dúvidas, se não influenciaram diretamente as transformações, ajudaram substancialmente a intensificação e a popularização do novo estilo. Pelo fato de agregarem multidões com o mesmo objetivo de expansão individual de suas imaginações.
São remontes que produzem a certa nostalgia condutora, por fim, à saudade.

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